Começo do processo com envio do dossiê

30 de outubro de 2010

Há quanto tempo que não te vejo!

O que deixamos no Brasil? Amigos, parentes e nossas lembranças. A nossa rua já não é a mesma, a praia deserta de nossa infância já não é deserta. No Brasil sinto a segurança de estar em minha terra, mas o desconforto cruel de uma imprevisível violência. Se atrás de muros vê-se muitos prédios subindo, a rua continua a mesma: violência pobreza e congestionamentos sem fim.

Recife

Há quanto tempo que não te vejo!

Não foi por querer, não pude.
Nesse ponto a vida me foi madrasta,
Recife.

Mas não houve dia em não te sentisse dentro de mim:
Nos ossos, nos olhos, nos ouvidos, no sangue, na carne,
Recife.

Não como és hoje,
Mas como eras na minha infância,
Quando as crianças brincavam no meio da rua
(Não havia ainda automóveis)
E os adultos conversavam de cadeira nas calçadas
(Continuavas província,
Recife).

Eras um Recife sem arranha-céus, sem comunistas,
sem Arrais, e com arroz,
Muito arroz,
De água e sal,
Recife.

Um Recife ainda do tempo em que o meu avô materno
Alforriava espontaneamente
A moça preta Tomásia, sua escrava,
Que depois foi a nossa cozinheira
Até morrer,
Recife.

Ainda existirá a velha casa senhorial do Monteiro?
Meu sonho era acabar morando e morrendo
Na velha casa do Monteiro.
Já que não pode ser,
Quero na hora da morte, estar lúcido
Para te mandar a ti o meu último pensamento,
Recife.

Ah Recife, Recife, non possidebis ossa mea!
Nem os ossos nem o busto,
Que me adianta um busto depois de eu morto?
Depois de morto não me interesará senão, se possível,
Um cantinho no céu,
"Se o não sonharam", como disse o meu querido João de Deus,
Recife.

Manoel Bandeira

2 comentários:

Breno Pessoa disse...

Nossa, eu estava lendo pensando que era seu, e pensando 'que legal'. No final, a assinatura!

Anônimo disse...

Achei esse blog por acaso enquanto procurava dicas de roupas pro inverno. Gostaria de agradecer imensamente por todas as dicas desse blog. Em janeiro darei entrada no processo de imigracao e pretendo morar em toronto. Muito obrigada!
Gabriela (de ReciFe)